segunda-feira, 29 de outubro de 2007

O “inimigo” chinês

“A China é um bom parceiro que faz a gente ficar 24 horas com palitinho no olho para não dormir, se não o bicho pega”.

Quando li esse comentário do presidente Lula nos jornais de 6ª feira senti-me um pouco mais aliviado. Embora a percepção existente é a de que o Presidente faz discursos e viaja, este não é o caso. Parabéns ao Lula que está vendo o que acontece ao redor do mundo e de onde pode vir o perigo. A “crise imobiliária” norte-americana está nas páginas dos jornais, mas a China, até agora, era tida como a “grande companheira” do Brasil. Continua sendo importante, é óbvio , mas o “inimigo” chinês pode nos criar problemas mas cedo do que imaginamos.

Em agosto deste ano a China foi o país que mais exportou no mundo, ultrapassando Alemanha e Estados Unidos. É verdade que agosto é mês de férias no hemisfério norte, mas ninguém pode negar que o fato é significativo pois os chineses exportaram nada menos do que US$ 111,4 bilhões no mês.

A concorrência da China fez com que o Brasil vendesse US$ 1 bilhão a menos para os Estados Unidos. Enquanto em 2005 participamos com 1,5% das importações norte-americanas e a China com 14,6% , em 2006 caímos para 1,4% do que o Tio Sam importa enquanto a China cresceu para 15,6%. E as perspectivas para o futuro são sombrias, conforme previsto pelo presidente Lula.

Como conseqüência desse modelo agressivo de exportações ( preços baixos, qualidade por vezes duvidosa, câmbio fixo e desvalorizado em relação às demais moedas etc) a China está, nos últimos 12 meses, com um superávit comercial de cerca de US$ 245,0 bilhões enquanto nós aqui no Brasil estamos na casa dos US$ 43,0 bilhões. E o acumulo de reservas internacionais cresce vertiginosamente, pois hoje a China possue, nada menos, do que US$ 1,43 trilhões investido em títulos.

Diante desses fatos, o que nos causa mais preocupação é a relação comercial entre o Brasil e a China. Nossas exportações passaram de US$ 5,5 bilhões - de janeiro a agosto de 2006 - para US$ 7,2 no mesmo período em 2007. Enquanto isso a China passou de US$ 4,8 bilhões em 2006 ( mesmo período) para US$ 7,5 em 2007. Isto é , hoje importamos mais da China do que exportamos. E ainda assim graças , especialmente , a duas “commodities” que representam mais de 50% das nossas exportações. Os “minérios de ferro e seus concentrados” são nosso principal item de exportação para o grande país asiático, com US$ 2,4 bilhões, seguido da “soja triturada” com US$ 2,2 bilhões. (sempre de janeiro a agosto). Dos doze principais itens de exportações brasileiras, a China aparece entre os primeiros dez maiores compradores apenas quatro vezes, todos produtos relacionados a categoria de “commodities”.

E para colocar um pouco mais de lenha na fogueira ( ou mais palitinho no olho, como recomenda o presidente Lula), um fato novo que passa a ter dimensões que começa a preocupar, é a “exportação” de inflação por parte da China. Até cinco meses atrás a China exportava “deflação”, o que era muito bom para os países importadores. A partir de Maio deste ano, os produtos exportados começaram a ter preços elevados uma vez que a inflação chinesa anda pela casa dos 6,0% ao ano (muito alto para os padrões mundiais). Os Estados Unidos, grande comprador chinês, já está pagando 1,6% a mais nos produtos importados e ninguém sabe, ao certo, até onde vai essa ( hoje ainda pequena) espiral inflacionária.

Diante dessa realidade, a última coisa que devemos fazer é tentar competir com a China nos principais produtos que ela exporta. É perda de tempo e prejuízo, na certa. A alternativa é continuarmos a ampliar nosso mercado exportador e abrir o leque de produtos exportáveis. Ganhos de produtividade são imprescindíveis e melhoria da qualidade é sempre um “plus”.

O que falta e foge do controle dos empresários, é o governo redefinir sua política cambial ( se é que temos alguma) , para fazer com que nosso “real” seja mais competitivo para os exportadores e não apenas uma moeda (aliada a alta taxa de juro local) que gera lucros fabulosos para os especuladores.