sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Brasil aposenta Bill Rhodes

A grande notícia do dia , estampada em todos os jornais, diz respeito a mudança verificada nos últimos anos e que culminou agora , em Janeiro de 2008, quando o Brasil deixou de ser devedor para passar a ser credor internacional. É um fato a ser comemorado, um grande avanço nas contas externas o que , na prática, eliminou nossa eventual vulnerabilidade externa. Com reservas internacionais acima de US$ 180,0 bilhões, não há quem se atreva a "atacar" o real.

Com isso, o nosso velho e conhecido Bill Rhodes, que toda vez que visitiva o Brasil era sinal de que tinhamos algum problema com a dívida externa, pode tranquilamente aposentar-se em em relação ao nosso país. O Brasil - nem os bancos credores - irão precisar mais dos seus préstimos pois o trabalho realizado nos últimos anos e, em especial, a renegociação da divida externa entre 1991 e 1994 surtiram os efeitos desejados. O Brasil até alí considerado um "mau pagador", efetuou contrato de longo prazo com o governo Fernando H. Cardoso cujo acordo foi cumprido por sua administração e , igualmente, pela administração Lula. Tudo que foi escrito e combinado entre 1991 e 1994, foi fielmente honrado pelos dois presidentes brasileiros. Só isso já é um motivo de orgulho para nós que, por força das atribuições que tinhamos no Citibank, acompanhamos os penosos anos da década de 80 quando qualquer acordo assinado não durava mais do que dois ou tres anos.Portanto Bill, as portas de Brasília continuam abertas, para visitas de cortesia.

Hoje passamos a ser credores internacionais, as firmas brasileiras investem no exterior, o dólar deixou de tirar o nosso sono, pois está sobrando no caixa. E, aí, paradoxalmente, começa o perigo.

Já dizia o saudoso Mario Henrique Simonsen que "a inflação aleija, mas o câmbio mata". Hoje o real é a moeda mais valorizada do mundo em relação ao dólar, o que, convenhamos nós, não representa a nossa realidade.

Como a preocupação número "um" do Banco Central sempre foi controlar a inflação - o que, na teoria , não está errado - o dólar foi também utilizado como "âncora"para tal fim. Dólar fraco permite mais importações o que faz com que os preços internos caiam. Essa situação, que não causava preocupação até o ano passado, já deu forte sinal negativo em Janeiro 2008 quando o saldo da balança comercial foi o menor desde Junho de 2002. Isto é, nossas importações, devido ao real valorizado, estão crecendo bem mais rapidamente do que as exportações, especialmente de bens manufaturados. Com isso os elevados superavits comerciais ( exportação menos importação) tenderão a cair ao longo do ano.

Tudo isso para dizer que o Governo tem que estar alerta para essa supervalorização do real. Graças às nossas taxas de juros elevadas continuamos atraindo capitais especulativos para arbitragens e com isso o real vai fortalecendo-se até chegar ao perigoso nivel atual de R$ 1,70.

Como nossa situação externa está consolidada, cabe agora ao governo reduzir essas vulnerabilidades impondo prazos ou limites para capitais especulátivos, fazendo com que o investidor estrangeiro pague o mesmo imposto que pagamos quando compramos titulos do Tesouro Nacional e assim por diante. O Governo tem um "leque de alternativas", não as aplica pois está preocupado com a inflação ou tem medo que tais medidas atrapalhem nosso sonho de sermos "investment grade" ainda este ano.

O certo é que temos uma conta altíssima para ser paga e o Governo não pode continuar "empurrando com a barriga". Isto é, comprando dólares no mercado para não deixar que o real despenque de uma vez e deixando o problema para administrações futuras.

Hoje, entretanto, temos que comemorar o feito alcançado mas a ressaca não pode ser muito longa. Esse assunto "câmbio" ainda exigirá muita criatividade do governo para que não troquemos a preocupação do passado com o "dólar" pela do futuro com o "real".