domingo, 23 de setembro de 2007

Relembrando

No dia 28 de Novembro de 2005 o jornal O Estado de São Paulo publicou artigo de minha autoria intitulado “O circo de Brasília”. Fazem portanto quase dois anos e o que temos visto é que a situação lá em Brasília só piorou. O mesmo Gabeira citado no artigo de fundo de hoje “ Democracia à brasileira” dizia à época que “20 cassações não vão resolver o processo de limpeza do Congresso”. E o que se viu é que o “mensalão” transformou-se numa verdadeira pizza e só uns poucos incautos foram punidos. Vale, pois recordar, para a sociedade começar a se posicionar ( o projeto “Cansei” é um começo tímido ) para que tenhamos um Congresso Nacional que não nos envergonhe.

O Circo de Brasilia

“O país perdeu a inteligência e a consciência moral, Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada, os caracteres corrompidos. A prática da vida tem por única direção a conveniência “

Eça de Queiroz, 1871

Quando garoto uma das minhas maiores diversões era assistir à matinê dos domingos do Circo Piolim, instalado ali próximo do Pacaembu. Sentava-me com amigos na arquibancada do, então, famoso circo, e divertia-me a valer com as palhaçadas do Piolim e seus ajudantes de palco. Sapatos mais parecendo pés de pato, calças de cintura folgada e o indispensável nariz vermelho. Eram dezenas de espectadores , vestidos da melhor maneira que podiam, assistindo aos impagáveis palhaços.

Os tempos mudaram, a televisão foi inventada, o Congresso Nacional passou a ter importância marcante nas nossas vidas, as CPI’s foram criadas e os papéis se inverteram. As declarações da última semana do amigo do presidente Lula e presidente do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), sr. Paulo Okamotto, foram, para mim, a gota d’água e um basta em toda essa hipocrisia a que assistimos diariamente pela televisão. Somos 170 milhões de “palhaços” - só nos falta o nariz vermelho - assistindo atentos por meses seguidos debates envolvendo senhores engravatados e senhoras bem vestidas. Só que ao invés de nos fazerem rir, nos fazem chorar. Chorar de vergonha , de desalento, pelo desprezo que muitos deles têm pela população brasileira. Mentem descaradamente desde que essa seja a melhor ou única saída, mas todos são tratados com o máximo respeito. V. Excia para cá, V.Excia para lá, e os resultados que a população aguarda , isto é, a punição exemplar dos responsáveis vai ficando para depois. O próprio presidente Lula em um dos seus inúmeros discursos afirmou, em Setembro, que “Não há por que ficarmos mais ou menos traumatizados. As mentiras e verdades que foram ditas vão aparecer e aqueles que tiverem culpa pagarão pelos erros cometidos”.

O que se viu até agora não representa o desejo do presidente, se é que ele ainda pensa assim. Quando seu amigo Okamotto afirma que pagou a dívida de R$ 29,4 mil que Lula tinha com o PT mesmo considerando que tal dívida era um equívoco de responsabilidade do ex-tesoureiro Delubio Soares, dá, mais uma vez, vontade de chorar. Não bastasse , afirmou que a dívida foi paga em algumas parcelas, em dinheiro vivo, pois era assim que deveria fazê-lo. Ora, na era da internet, qunado as transações eletrônicas estão deixando para trás inclusive os cheques, o sr.Okamotto e seus amigos do PT ainda circulam com dinheiro vivo. Ouvindo tal declaração, o velho Piolim me volta a cabeça pela sua pureza de propósitos, isto é, divertir e não ludibriar a criançada.

Mas o circo de Brasília tem muito mais a nos ensinar. Embora cada partido tenha interesses próprios a defender, as CPI’s procuram realizar seu trabalho , tentando desvendar o “valerioduto” - de onde veio e para onde foi o dinheiro. Mas as barreiras são enormes. Muitos dos depoentes lá aparecem com “habeas corpus” debaixo do braço o que lhes permite mentir, e o fazem, sem o risco de sofrer qualquer punição. Bandidos são tirados da cadeia para, amparados pela “delação premiada”, declararem aquilo que não declararam quando foram presos. Se conseguirem criar fatos novos, suas penas serão reduzidas. É uma beleza essa lei de 2002, que premia o delator. A votação da cassação do deputado federal José Dirceu sofreu, na última semana, seu 3º adiamento e tudo depende do que acontecerá nesta semana. Ou será cassado como indicava o deputado Fernando Gabeira ( “Ele, Dirceu, tem uma história política, mas se perdeu no caminho”) ou novas surpresas surgirão ( inclusive por parte do Supremo Tribunal Federal), pois agora o vice-presidente José Alencar passou a defendê-lo publicamente, o que não faz com relação ao ministro Palocci, por exemplo, que só recebe críticas pelas “altas taxas de juros”. É , os juros devem ser crime maior do que aqueles que o deputado José Dirceu eventualmente cometeu.

O nariz do povo brasileiro fica vermelho outra vez quando depois de acompanhar atentamente a CPI conhecida como do “Mensalão”, toma conhecimento pela imprensa que o prazo da mesma esgotou-se antes que o relator, deputado Ibrahim Abi-Ackel, pudesse apresentar o relatório final . O vergonhoso e comprovado “mensalão”, que foi habilmente transformado em “caixa 2”, agora fica no limbo ou, conforme definição de um jornalista, “a pizza foi servida crua e fria”. Por essa e por tantas outras, fica fácil entender a razão da morte da “Velhinha de Taubaté”. Nem ela que sempre acreditou nos políticos e no Brasil teve forças para enfrentar mais esse duríssimo desafio.

Mas os 170 milhões de “palhaços” estão perdendo a paciência. Pesquisa de opinião da CNT/Sensus divulgada na última semana mostra que o Presidente Lula tem, atualmente, a pior avaliação do governo quando, segundo ele, tudo vai muito bem, o país crescendo em ritmo sustentado. A avaliação positiva que em setembro era de 35,8% caiu agora para 31,1%. e a maior parte dos pesquisados ( 42,8% ) acredita que Lula “participou da corrupção”.
Diante desse vergonhoso quadro para nós brasileiros, concordamos,mais uma vez, com o deputado Fernando Gabeira quando ele afirma que “Vinte cassações não vão resolver o processo de limpeza do Congresso”. É preciso muito mais gente fora do Congresso, depoentes que falsearam com a verdade colocados na cadeia, para que o Brasil volte a ser respeitado e os palhaços - aqueles verdadeiros, que fazem rir e não chorar - fiquem limitados aos picadeiros dos circos ainda existentes nesse país afora.

Um comentário:

Anônimo disse...

Quero comentar que é muito bom ter on line a opinião, sobre assuntos políticos e econômicos, de quem tem um histórico de ética em aconselhamentos.
Tive o prazer de ouvi-lo numa palestra aqui em Brasília, e senti-me muito honrada.